A vida chata e saudável
Depois de três meses e meio de dieta rigorosa (uma das PRIMEIRAS ordens de qualquer médico ao ver que você tem uma hérnia e tem barriga), fui fazer um exame de sangue completo, com hemograma e hepatograma, entre outras coisas. É claro que, após três meses longe das pizzas e do álcool, minha expectativa era de que o resultado desse meu exame fosse o de um igual a de um atleta de decatlo. Qual o quê. Meu colesterol está em 130mg, e embaixo uma notinha alerta: “desejável abaixo de 116mg”. Puta que o pariu. Pelo jeito, antes da dieta eu estava à beira de um infarto do miocárdio e não sabia.
Na parte hepática, tomei outro susto: Gama GT e TGP bem acima dos níveis permitidos. Meu amigo Maloca, ex-dono de birosca, avisa sem pestanejar, meio às gargalhadas: “Isso aí é CACHAÇA”. Nem adianta eu dizer que não bebo desde 10 de julho – o fígado demora para se recuperar do prejuízo. Enfim, ainda devo consultar um amigo que é especialista no assunto.
O que importa é que agora, com 61kg (peso ao acordar), estou começando a repensar a vida em todos os aspectos, e já me preparo para sair daqui da minha cela de bicheiro. Claro, se eu ficar muitas horas em pé e andando as dores imediatamente voltam, por isso tem que ser algo gradual. E tenho que manter a dieta, o que significa que só me relacionarei da forma mais correta com uma pizza no ano que vem.
Só quem já foi gordo – e no meu caso, gordo (com mais de 75kg) e baixo – é que pode avaliar o quanto é bom emagrecer, apesar de, para isso, você ter que realmente esquecer que comer pode ser prazeiroso. É aquela velha história: em vez de viver para comer (que é bem mais prazeiroso, bem mais legal), você come para viver. Ora, ma que catzo, por que meu colesterol está alto e o número de hemácias está ligeiramente abaixo do ideal?
Resposta: porque eu já estava comendo para morrer. E o cara do Rei dos Sucos, a quem eu pedia um ChesseBacon e um folhado de catupiry para o lanche, nunca me avisou isso. Aliás, quer emagrecer? Tire do vocabulário as palavras “bacon” e “catupiry”.
É chata, essa vida saudável.
Mas se você deixa de lado o prazer de comer – assim como gente deixa de lado o prazer de beber, o prazer de fumar – a coisa é diferente. Fica muito boa, essa vida saudável.
Vestir uma calça deixa de ser uma tarefa que exige 20 minutos do seu tempo e um ar condicionado ligado – qualquer calça serve. No meu caso, sem cinto agora nenhuma calça serve, todas caem sozinhas até o chão. Camisas? Tudo folgado. Aposto como ao chegar do trabalho as roupas não estarão mais pesando 900 quilos (800 só de calça jeans).
Ao dormir, as coisas melhoram – gordo, eu acordava toda hora no meio da noite. Depois de emagrecer, vou até de manhã. Até mesmo a chegada do calor já não me deprimiu tanto (quem tem hérnia gosta do calor) quanto antes. E descobri que todo gordo sua, por isso a chegada do calor é tão aterrorizante.
Tudo isso sem falar na digestão, algo que deixou de ser um processo semelhante ao relacionamento da jibóia com o búfalo cafre que vi outro dia no Discovery Channel. E acho que essa facilidade digestiva e o posterior aumento na qualidade de vida se devem à velha máxima proferida pelos bons endocrinologistas: tome café da manhã como um rei, almoce como um príncipe e jante como um escravo.
Nenhum bom regime dá certo se o freguês não começar primeiro com esse preceito. Nem que o cara no café coma pizza com bacon, no almoço detone uma picanha e no jantar mate só um sacão de fandangos.
Enfim, é bom viver respirando bem, sem a pele estourada, sem o estômago ardendo, sem o fígado chiando, sem pontadas estranhas, sem problemas no sono, com tudo em cima (tirando, é claro, a dor na coluna e na perna direita).
Mas preciso ir a um psicólogo para que ele me explique o que é esse sonho recorrente no qual eu caminho incólume por lindos campos de orégano.
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