Nada como um dia igual ao outro
Horário de acordar: entre 5 e 5h30, pela manhã
Horário do café da manhã (sempre o mesmo: iogurte com morangos inteiros, cereal, três torradas com geléia, mel e requeijão light, um pão integral torrado com queijo minas, uma maçã comum, uma maçã verde, um copo de mate, e finalizando uma xícara de café): entre 6h e 7h
Horário de tomar o Deflanil: 7h
Horário para assistir a noticiários: de 7h às 9h
Horário para ler: de 9h às 11h
Horário para tomar banho: 11h
Horário da primeira série da Sony que eu assisto no dia (Home Improvemente, com o Tim Allen, gosto muito): 11h30
Horário de começar a ver os péssimos programas esportivos: 12h
Horário de almoçar: entre 13h e 14h (sopa de legumes com algo sólido para quebrar a fome, que pode ser frango assado, panquecas ou suflê de verduras, se é que isso é sólido)
Horário de ouvir música (Tom Waits, Frank Sinatra, B.B. King, Miles Davis, Natalie Merchant, Jimi Hendrix, Rolling Stones, Chet Baker): de 14h às 15h30
Horário de ler mais (Hiroshima, de John Hersey, A Caverna, de Saramago, Todas as Comédias, do Veríssimo, Freak Brothers, Piratas do Tietê, jornais e a obra completa de João Gilberto Noll)
Horário de acender uma vela (literalmente, com fins religiosos mesmo, acreditem): 18h
Horário de ver mais televisão ou até arriscar um filme: 18h
Horário de ver “Friends” quando minha namorada está perto de mim (que é quase sempre): 19h30, na Warner
Horário de tomar Diet Shake e duas torradas s/açúcar: 20h
Horário de tomar mais um Deflanil e Arcoxia: 20h15
Horário de pensar em tomar um Lexotan e dormir: 21h30 às 22h
Horário de colocar uma bolsa quente nas costas: vários ao longo do dia
Sim, esse tem sido o meu dia desde 01 de agosto, que foi quando um médico decente, ao ver minha ressonância magnética, determinou que eu passasse o tempo todo deitado. Agora, barra pesada mesmo foi quando, passado um mês, voltei ao consultório dele para fazer testes e ver se eu podia voltar a trabalhar (é a frase mais estranha que já escrevi na minha vida, mas acreditem: estou louco para voltar a trabalhar) e, enfim, a viver uma vida normal.
Ele disse várias coisas boas. “É, você melhorou bastante, diminuiu a compressão sobre o nervo, clinicamente houve grande evolução...”, isso tudo com meu sorriso crescendo discretamente. De repente: “Mas vai ter que passar MAIS UM MÊS em casa”.
Tremenda ducha de água fria, pensar que a lista acima teria que se repetir até o fim de setembro.
O pior foi que o médico reduziu as dosagens de remédio e a dor deu uma leve piorada. Aliás, só o fato de ir ao médico e voltar já fez a dor voltar um pouco, o que provou que ele estava certo, não podia mesmo voltar a trabalhar.
Só posso pedir a todos que lêem isso aqui: NÃO TENHAM hérnia de disco (ainda não entendo como a Isabela pode conviver com três, como ela disse outro dia). Corrijam a postura, chequem sempre que sentirem a menor dor, fiquem atentos às dores que por acaso apareçam ao longo da perna (indo até o pé), cuidem sempre antes. Ouçam segunda opinião – no meu caso, o primeiro médico que consultei conseguiu diagnosticar uma simples inflamação na virilha onde na verdade havia uma hérnia de disco. Segundo me consta, equivale a examinar um paciente com pneumonia e diagnosticar unha encravada. O resultado foi que o doutor me receitou uma fisioterapia que simplesmente aumentava a extensão da hérnia.
A cada dia que passa, aumenta o desejo de voltar a sair, a ver o dia, a participar da civilização. Para agravar, moro em cima de um apartamento ocupado somente por mulheres, de diversas idades, que cuidam de dois gatos e dois cachorros, estes últimos extremamente barulhentos. Uma das mulheres tem 17 anos e ouve Bon Jovi com a dedicação com que eu escuto, por exemplo, o Abbey Road dos Beatles (só que com volume muito mais alto).
A todos que ligam, eu digo a mesma coisa: estou na cadeia, só que cadeia de bicheiro, com TV, livros e DVD – mas acredito eu que os bicheiros comiam, ao passo que eu, em função da dieta que a hérnia exige, passo fome o dia inteiro. Claro que passo fome – fazer dieta é o oposto da vontade de comer, é vontade de passar fome. Esses dias todos me deram um ensinamento filosófico essencial, que nem os maiores sábios chineses seriam capazes de assimilar: a verdadeira fome só pode ser aniquilada com o consumo de pizzas, massas em geral ou carnes na brasa. Portanto, estou condenado a existir com fome, já que não posso mais ter barriga grande.
Bom, pelo menos uma vez por semana vou ao Zio Pepperoni. Senão, prefiro a eutanásia.
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