30 outubro, 2003

Merda
O título deste post não é um lamento, não é um desejo de boa sorte para um ator antes de entrar no palco, não é um grito depois de uma topada, nada disso. Escrevi esse título usando a palavra no sentido mais literal possível. Recomendado por um neurologista a dar pequenas caminhadas, descobri que a Urca tem, sim, algo que os outros bairros não têm: muita merda.
A variedade é enorme – assim como o tamanho de alguns cagalhões, o que dá a entender que por aqui deve haver cachorros São Bernardo ou filas brasileiros. Ou então mendigo gordo, se bem que mendigo careca e/ou gordo é coisa que eu nunca vi. Assim como nunca vi velho gordo, com mais de 60 anos. Gordo geralmente morre cedo. É triste, mas parece ser real.
Mas voltando à merda, me impressiono com a má vontade dos donos de cachorro com o assunto. Aqui na Urca, se for avaliar pela quantidade de latidos noturnos em volta da minha casa quando eu quero dormir, calculo que haja um cachorro para cada cinco habitantes. Se considerarmos que a população do bairro anda na casa dos 10 mil (segundo um censo bem antigo), é lícito afirmar que dois mil cachorros derramam seus cagalhões impunemente pelas terras do outrora melhor bairro do Rio.
Os donos? Cagam e andam. Em todos os sentidos.
Na caminhada de hoje, que foi de 300 metros (mais que isso é perigoso para mim), vi merda de três em três metros. O pior é que não dá nem para reclamar de governo ou Prefeitura. O que as autoridades têm a ver se os moradores de um bairro adoram ver seus lulus bostejando nas calçadas, cagando como se fossem verdadeiras usinas de merda?
Geralmente, é gente que tem dinheiro, que tem ‘tradição de Zona Sul”, que torpedeia os ouvidos do alheio com discursos de “eu amo o Rio”, mas que não hesita em deixar ao semelhante a herança da digestão escabrosa do melhor amigo do homem.
Me irritou muito, tudo isso – e olhem que eu sequer pisei em um tolete. Vejo como problema sem solução. Talvez se convencermos os donos de cachorro a levarem seus bosteiros ao meio-fio, mas é muito difícil. Não querem nem saber. Diversas vezes já vi verdadeiras montanhas de Wyoming depositadas nada menos que na portaria de prédios – o cidadão que mal tem grana para comprar papinha Nestlé para seu filho sai e “glitch”, enterra o sapato novo até a borda no bonzo processado organicamente.
Eu ainda fico mesmo é com “seu” Alaôr: nada de cachorro, o melhor amigo do homem mesmo é o peido. “Nunca ataca o próprio dono”, conclui ele, soturno.