22 fevereiro, 2002

Oss lustiga vara!

Nós estamos nos divertindo! Esta é uma frase em sueco que aprendi ontem com a Eva (pronuncia-se Iéva), minha “inquilina”. Ela é amiga de um amigo meu e não tinha para onde ir. Ele lembrou de mim - mais precisamente da minha falta de dinheiro – e, juntamos o útil ao agradável por força das circunstâncias. Por enquanto, estamos nos dando bem.
Eva tem 28 anos, está no Brasil há 1 ano e 3 meses, é muito tranquila, fala muito bem português, está dando aulas de inglês num curso e está procurando um namorado. Ela me contou que, na Suécia, a maioria dos apartamentos são construídos para apenas uma pessoa. Muitos homens passam a vida inteira sem ter mulheres, e isso é muito triste. As mulheres, por sua vez, se enclausuram em suas casas, complexadas, considerando-se gordas e feias, cumprindo, apenas, a obrigação de trabalhar. Pouco se divertem. Quando Eva viu as pessoas dançando à vontade no Rio de Janeiro, soltou-se como um papel ao vento. “Meu Deus, ninguém vai reparar se eu estou dançando, que bom”, disse.
Sem cobranças. Ela pode exibir sua barriguinha branca na praia sem problemas. Ela pode apenas dançar, ninguém irá recriminá-la. Ela pode até iniciar conversa com um cara que ela achou interessante, também, e daí? Liberdade.
Nesses tempos de Big Brother e Casa dos Artistas, depois dessa conversa com a Eva, pensei na Igreja Católica e nas freiras do colégio onde estudei dizendo que Deus estava me olhando, por isso eu tinha que ser "direitinha" e "boazinha". E eu imaginava Deus com olhos bem grandes, me vigiando, seguindo todos os meus passos, sabendo se eu mentia, se eu comia biscoito antes do almoço, se eu pensava no menininho que eu gostava. Quanta culpa. Eu quase queria não ser, assim fugiria dos olhos grandes de Deus a me vigiar. Mas depois eu esqueci Dele, e comecei a “invadir” sua casa, como se quisesse comprovar que Ele não era nada de mais. Assim como eu. Fora do horário, eu e uma amiga arrombávamos as portas da capela e tocávamos o velho órgão do colégio fazendo muito barulho. Íamos ao altar e fingíamos rezar uma missa, segurando o cálice acima da cabeça, falando alto, fazendo eco na capela vazia. Quando alguém aparecia, nos escondíamos dentro do confessionário, às gargalhadas, leves e ignorantes do rompimento que estávamos travando.