31 janeiro, 2004

Táxis e pescoções
Tem me faltado mais disposição do que tempo para entrar nesse blog e escrever algo decente. Na verdade, pela manhã estou andando ali pela Praia Vermelha (ou às vezes correndo), e quando chego em casa detono um café da manhã pesado e saio direto pro trabalho. E na volta é que me falta disposição - talvez porque o computador fique no quarto que não tem ar-condicionado.
Hoje, porém, estou de folga, aquela folga pós-plantão - você descansa depois de doze dias. Em função de há pelo menos dez anos eu trabalhar aos sábados e domingos com regularidade, criei até a expressão "sexta-feira falsa", para me referir àquelas sextas em que todos estão no clima do fim-de-semana e você só pensa na frase "puta que pariu, que merda, estou de plantão".
O sábado é um dia que na verdade deveria ser nome de um sentimento. O que se sente às três da tarde de um sábado é inominável. Sentimento igual, talvez só o de um chester ao atravessar incólume os dias 25 de dezembro e 1 de janeiro.
Acordo ainda na lembramça do chope pós-pescoção (para os raros não-jornalistas que lêem isso aqui: pescoção é quando a gente edita o jornal de domingo na noite de sexta-feira), de ter bebido uns sete ou oito chopes no Diagonal Grill, no Leblon, único lugar aberto e decente em que pobres jornalistas possam fazer seu happy hour às quatro da manhã.
Me lembro de ter pego um táxi em frente à casa de Marcele. O táxi tinha insulfilm, e quando sentei no banco de trás (às cinco da manhã só se pega táxi sentando no banco de trás) a primeira coisa que o taxista perguntou foi : "Tu joga bingo, parceiro?".
Claro, são cinco da manhã e você entrou em um táxi no qual o cara pergunta se você joga bingo. A resposta, nesses casos, tem que ser a mais imoral possível, e fazer o taxista se sentir até um molecote perto de você. Se ele perguntar se você bebe cachaça, você tem que responder que sofre do fígado e por isso prefere via intravenosa para as suas drogas. Por isso, respondi pisando forte:
- Não. Prefiro cavalos.
O cara deu uma hesitada. Esperei ele engolir em seco e continuei:
- Os bingos realmente podem ser mais compensadores, mas acredito mais na capacidade que se tem de prever os páreos. Se você pega um páreo com sete ou oito cavalos, é só excluir, por exemplo, produtos de cinco e seis anos que estejam inscritos, e trabalhar com potros de até três anos. Pelo retrospecto, você vê em que turma estava cada um antes daquele páreo, e vê o resultado de cada um. Colocação é menos importante do que tempo. O cavalo pode ter tirado último em 1.300 em uma turma de 76s, mas é melhor do que primeiro em uma turma de 80s, por exemplo. Se você combinar em uma quadrifeta e ainda cercar com inexata e um placêzinho (golpe final: a intimidade) de 20, dá para ir, se divertir e ainda sair com algum no bolso.
Dali em diante o taxista prosseguiu me chamando de "brother". Mal sabia ele que eu não vou ao Jockey há anos. Mas aposto como se eu tivesse dito a ele que eu saí do trabalho às três da manhã, ele ficaria muito mais assustado.