16 fevereiro, 2003

Werfremdungseffekt
A expressão acima, em alemão, significa algo como "olhar de estranhamento" ou "efeito de quem é estrangeiro a tudo". Teria sido criada pelo Bertolt Brecht. Não, eu jamais li uma linha sequer de Brecht e sequer pretendo ler. Minto. Li aquele texto chatérrimo, "O analfabeto político", que era estampado em camisetas e nos induziam a concluir que todo mundo que não usava estrelinha do PT, preferia bolsas comuns e não tinha lido nem o "Livro Vermelho" nem "O Capital" era babaca. Ou no mínimo culpado.
Conheci a expressão "werfremdungseffekt" em uma crônica do Fausto Wolff, jornalista de esquerda radical, inteligentíssimo, conhecido nos meios como "lenhador canadense", devido a seu porte físico gigantesco. Ele a usava para ilustrar a maneira com que devemos nos comportar diante do mundo, da miséria, da violência, da fome. Pelo menos uma vez por mês devemos olhar para a realidade que nos cerca com o tal "werfrendungseffekt". Nem que seja para fazer como Cortázar, "Instruções para chorar", pensar em um pato morto coberto de formigas ou em um desses golfos do extremo Sul onde ninguém jamais passa.
Hoje, vi pássaros voando muito alto, em formação de >. Fiquei pensando, "quando eles cansam, ou somente um cansa, como decidem que vão parar, como decidem onde vão pousar para descansar?. Meio assustador.
Aí você acordar no meio da noite e pensa, "assim é a vida?". "Eu vou sobreviver? Estou fazendo algo certo? Não vou virar mendigo? Serei necessário em alguma coisa?". É quando nosso olhar de estranhamento se volta para nós mesmos. Também poderia ser substituído por "o horror, o horror".
Mas olho uma fotografia na minha cortiça, lá está ela, me abraçando e sorrindo. E, por um momento, meu olhar já não era de estranhamento, e sim de carinho, de saudade (dois dias sem nos vermos). E pensei que juntos, perto um do outro, não teremos medo.