14 julho, 2005

Bestas-feras ou o país de Mauro Marcelo



Outro dia, em um debate de jornalistas no Jô Soares (o gordo no meio de quatro mulheres), foi exibido um clipe da CPI Mista do Mensalão. Gritos, ameaças, réplicas furiosas, várias pessoas berrando ao mesmo tempo, enfim, uma babel de grunhidos foi o que se viu no clipe de cinco minutos. Como já comentei alguns posts antes, tudo isso para, como já sabemos, nada ser feito, ninguém ser preso, no máximo uma bocada ou outra ser cancelada, e vejam bem: temporariamente.
Estou sendo pessimista? Ok, me dêem um nome, apenas um nome de uma pessoa de posses que esteja presa no Brasil por obra de inquérito encaminhado ao MP por uma CPI. Lembram-se dos anões do Orçamento? Ninguém. CPI do Collor? Neca. As duas CPIs do futebol, a do senado, presidida por Geraldo Althoff, e a da Câmara, se não me falha a memória, presidida por Aldo Rebello, terminaram em alguma gaveta do Ministério Público Federal, provavelmente sem força para respirar em um país sufocado por comemorações do Penta, da Copa América, etc, etc.
Só a CPI do futebol (leia-se CPI da Nike) já é uma prova inequívoca que a política ademariana do Rouba Mas Faz ainda tem muita força no país. Claro, para usar a figura de outro político tradicional, o José Maria Alckmin (nenhum parentesco com o governador de SP), o que importa é a versão dos fatos.
E nunca, nunca em tempo algum, nem na ditadura militar que enriqueceu muitos dos nossos contestadores (alguns deles no governo), houve tanta censura, tanta pressão no Brasil, por meio de grupos econômicos. Por essas e outras é que em certos jornais esportivos a investigação acerca dos desmandos na CBF é curiosamente suspensa, por essas e outras é que os mensalões de governos anteriores não são investigados, e, já que este blog foi incluído na lista do Vox libre, vale dizer, por essas e outras é que se investigam os policiais em vez de se investigarem os criminosos - como no surreal caso da rinha de galo, em que o publicitário Duda Mendonça falou em rede nacional que é infrator mesmo e daí. Oito meses depois, os delegados que o prenderam em flagrante respondem a inquéritos, sindicâncias, são perseguidos, perdem tempo, saúde, são esquecidos pela mídia, são transferidos para longe de suas famílias, o diabo, tudo com o poder central por trás das retaliações.
E isto se permite no Brasil.
Se fosse o cidadão comum, por exemplo, preso com maconha e falasse para todo o Brasil, "eu fumo maconha mesmo e todo mundo sabe disso", é óbvio que estaria preso. Mas é o Duda, e por isso além da impunidade se tem o privilégio de atirar no ostracismo aqueles que descobriram seu delito.
Aí vem o tal Mauro Marcelo Lima e Silva, que eu não conheço, e, ainda no cargo de diretor da Agência Brasileira de Inteligência, chama os parlamentares da CPI de bestas-feras. Quem viu o tal clipe no Jô e ouviu isso, provavelmente pára pra pensar. Seria a frase de Mauro Marcelo uma opinião ou uma denúncia?
Mauro Marcelo, claro, já foi afastado da direção da ABIN, exatamente um ano depois de tomar posse e ser elogiadíssimo pelo próprio Lula, ressaltado como defensor da democracia. E, pelo pouco que já li dele, indicado por pessoas da área de segurança pública em São Paulo, é bem possível. Não sei se é o caso de achar que seu ataque aos deputados da CPI foi um ataque ao Legislativo. Para mim, foi um ataque de qualquer cidadão ao ver o tal clipe no Jô Soares.
Seu afastamento - obviamente elogiado pela imprensa - me soa, portanto, como aquele sujeito que é silenciado por ter gritado que o rei estava nu. Seu afastamento foi tão imediato e rápido, porém, que duvido ter dado tempo de Nossa Majestade se vestir. Continuamos sendo, sim, o país das bestas-feras, o país do vídeo, aquele onde deixou de valer o escrito (só no jogo do bicho) para valer o televisionado. Grita-se no plenário, silencia-se nos bastidores.
O único grito é, "garçom, mais outra pizza". Afinal, eles não são bestas.

1 Comments:

At julho 18, 2005 10:39 PM, Anonymous Anônimo said...

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