20 agosto, 2004

A idade crepuscular

A expressão acima era usada por um professor que tive na UFF, Eduardo Neiva Júnior, como auto-referência. Sempre que ele procurava justificar sua total falta de saco para tudo, soltava a pérola. Quase 15 anos depois de minha entrada na universidade, me vejo repetindo a frase: estou em idade crepuscular. Percebi isso ao sentir que, há dez anos, provavelmente eu iria adorar o Teatro Odisséia, onde fui ontem por causa do aniversário de um amigo. São três andares, um deles, no meio, com mesas e cadeiras, o andar superior com um bar próprio e supertelão, e o térreo sempre com um show.
E é aí que entra o peso da idade e a rabugice total: as possibilidades de ser um show agradável são muito perto do zero.
Em primeiro lugar, o som é extremamente alto, o que cria o folião-involuntário. Mesmo que você não tenha ido lá para o show, é impossível não participar dele. No terceiro piso, tentei acompanhar no telão um show do Radiohead. Vi Thom Yorke dando urros inacreditáveis. Era o vocalista da banda lá do térreo. Depois, veio o R.E.M. com “Everybody hurts” ao vivo, em ritmo de funk. Mais uma vez, o baixo violentamente distorcido invadia e destruía qualquer perspectiva de se concentrar em outra coisa.
O local tem uma grande vantagem: o chope Imperial a R$ 2,90 é uma alternativa viável à cerveja (em lata) a R$ 3,50. Sou absolutamente contra a cerveja em lata, por isso fui de chope. Só que aos poucos fui percebendo, pela infra-estrutura que havia, que a fila para pagar a comanda e sair do local seria uma experiência absolutamente aterradora. Fiz a tática então de deixar a festa no auge.
Voltei para casa pensando: por que marcamos festa de aniversário em locais nos quais outras 300 pessoas estão pensando em passar a noite? Encontro uma amiga que não vejo há tempos, no Odisséia, e ela me diz: “Sábado tem meu aniversário, vai ser na festa Ploc, no Catete”. Legal, mas, pelo que percebi na única vez em que fui na tal festa, outras 250 pessoas devem dar uma de penetra. Me lembro de já ter cometido esse erro: marquei aniversário na Casa da Matriz, numa sexta-feira. Hoje tenho vontade de pedir desculpas pessoalmente a cada um dos convidados. Normalmente, são pessoas que jamais sairiam de casa para, em janeiro, entrarem num local absolutamente lotado e quente.
Quanto mais me aproximo da idade provecta, portanto, menor é meu apreço por multidões que não sejam aquelas reunidas para torcer pelo Flamengo. Aliás, se minha data de aniversário não fosse tão pouco afeita às tabelas dos campeonatos (dia 2 de janeiro não tem nem pelada na praia), marcaria uma festa nas arquibancadas do Maracanã. Se alguém reclamasse, eu diria, “é mais vazio que a Casa da Matriz”.
Enfim, o Teatro Odisséia até que pode ser um bom lugar. Mas à medida que as rugas nos cantos dos meus olhos vão aparecendo, meu conceito do que é se divertir vai mudando radicalmente. Daqui a pouco, até jogar damas em uma praça pode virar programa de índio para mim. Basta a praça estar cheia.