04 novembro, 2002

Dois casamentos e um funeral
Em um espaço de três meses, dois amigos vão se casar. Sem nomes, claro. Lista de casamento é complicada, jamais escreveria nada publicando os nomes dos caras que vão casar - vai que algum excluído da lista para a boca livre lê e aí se cria uma mágoa desnecessária. Para quem tem muitos amigos e pouco dinheiro, fazer uma lista de casamento deve ser algo tão desagradável quanto elaborar uma lista de demissões - com a diferença que o cara que exclui alguém da lista de um casamento com certeza sente mais dor do que aquele que consolida um passaralho (na maioria dos casos, claro).
Essa fartura de casamentos me fez notar que eu fui a poucos. Raramente sou convidados para casamentos. Não, ainda não caí na hipótese de que sou pé frio e que neguinho me evita por causa disso. Acho que na verdade é que os casamentos nos quais eu realmente gostaria de ir ainda não aconteceram.
O meu, por exemplo, se nenhum imprevisto antecipar ou adiar, será em 2004.
Casamento é um ritual que tem lá sua melancolia. Uma espécie de funeral em que o defunto fica magoado com quem só manda telegrama ao invés de ir pessoalmente - sem contar que ninguém pensa em cortar a grava do defunto nas ocasiões fúnebres de verdade.
Mas é neguinho em volta, "o cara não vai ser mais o mesmo" - ou seja, o cara, pelo menos do jeito que ele era, morreu. E quando pessoas muito queridas se casam, e rola todo aquele reencontro, existe a sensação de que estamos dentro de um filme que está acabando, e que uma época de nossa vida passou.
Mas aí, me veio à mente, quando eu voltava de ônibus: casar, quando os dois acertam a mão, é um achado. Só quem já ficou muito tempo profundamente sozinho como eu pode entender o significado de encontrar aquela com quem vai se casar. Muito tempo? Bom, entre o fim do namoro anterior e o dia em que encontrei Marcele se passaram exatos 14 meses.
Sim, casar é um achado. Às vezes, não percebemos isso, pois vemos as experiências fracassadas como exemplos, e tudo o mais. Mas quando se sente que encontramos aquela que pode ouvir as nossas coisas mais inconfessáveis (do tipo "Votei no FHC em 1994" ou "Eu fui fiscal do Sarney"), casar se torna um acontecimento de extraordinária importância, a celebração, sim, de uma época.
É como eu estava conversando outro dia, com um dos que vão se casar: "Em 1998, tudo foi muito alegre, mas foi como na Copa do Mundo: chegamos quase lá. Já 2002 levamos o penta, e chegamos lá: casamento, Copa, Lula Presidente". Enfim, como se não fosse mais final de filme, e sim, daqui para a frente, na nova maneira de ver as coisas,
um começo.