17 maio, 2002

"Família, família, almoça junto todo dia"
Na minha família só tem maluco. A começar por mim. Tem tia, primo e filho de primo que não acaba mais, é uma multidão. A maioria eu esqueço que existe, só tenho notícia quando encontro na rua, ou quando ligo para aquela única tia com quem me identifico e fico sabendo das novidades:
- Você não sabia? A Isa se separou; a Bela casou e está morando em Londres; a Jô esteve numa fase difícil, envolvida com drogas, mas agora está bem. Teve um neném. Coitadinho, nasceu doente.
Então eu fico penalizada, o quanto a distância me permite, e me lembro de um primo, aquele que era modelo, e pergunto por ele também. Não é mais modelo, agora é pai. E a avó dele, minha tia, parou de fumar? Que nada. Já teve enfisema e não está nem aí. Fico sabendo, ainda, que a Lu surtou e o irmão dela está numa tribo indígena no Mato Grosso. No domingo, almoço na casa da minha mãe e conto as últimas notícias. Ouço expressões como “é mesmo?”, “nossa”, “que bom” e surgem algumas boas lembranças, da época em que vovó trazia abacates do sítio.
“Papai esteve lá em casa ontem”, informa Adriana, minha irmã mais velha. Silêncio na sala. Ana fica calada. Mamãe ri. Na nossa "panelinha", o tom muda de figura. Falem mal de algum de nós e entrarão na porrada, mesmo que a gente concorde. Só nós temos o direito de nos magoarmos.
Comecei essa história toda para falar da minha mãe. Como é forte a minha mãe. Com aquela aparência frágil, 45 quilos, mesmo assim, ela parece ter os ombros daquela poesia do Drumond. E é engraçada, também. Ontem ela quis me convencer a abandonar o cigarro. Apontou a foto do bebê no maço e disse: “viu, minha filha, que coisa horrível, você devia pensar nisso”. “Hãhã”, respondi. “Sua irmã parou, levou um susto, você devia fazer o mesmo”. “Vou parar, mãe, vou parar”. Ela deu um sorrisinho de lado e veio com essa: “então pense no seu gato, coitado, ele já sofre de asma, vai ficar pior ainda respirando essa fumaça” e desabou de rir.