Adeus ao nunca
Perdemos pessoas ao longo do caminho - e não nos avisaram disso desde o início. Nunca, nunca nos acostumamos. E não falo apenas dos mais próximos, mas de todos. Ano passado, foi um dia difícil o dia em que George Harrison se foi, pois eu estava acostumado à existência dele, lançando um disco uma hora ou outra, participando de shows, trazendo sua música maravilhosa ao mundo. E de repente, não tenho mais George Harrison. Ou tenho? Enquanto tiver a mim mesmo, creio que eu tenho.
E em um flash vejo Elvis na TV - acompanhei tudo sobre sua morte, em 1977, e até hoje me emociono com seu jeito de cantar "Suspicious Mind", música que lembra sempre uma prima, até hoje ao ver sua imagem penso que o mundo não ficou melhor, definitivamente, sem Elvis - nem que pelo menos uma vez por ano ele aparecesse para todos ao mesmo tempo, cantando "Always on my mind".
E Lennon. Vivi a ida de Lennon, de forma violenta, abrupta, naquele ano de 1980 - eu começando minha vida, aos doze anos, e Lennon terminando a dele. E ouvia Across the universe, uma das mais lindas canções de todos os tempos, e me lembro, e me lembrarei, de meu tio dizendo "Esta música me lembra Adeus ao nunca", e de fato Across the universe lembra isso. É como se os Beatles tivessem pensado em fazer uma música para negociar com Deus, como se eles tivessem preparado uma trilha sonora para o encontro com Ele - que foi, pelo jeito, antes do tempo (em qualquer sentido que se queira dar).
Claro, como muitos sabem, um outro ídolo meu também se foi, em 1984, um ano tão literário - só que este ídolo era mais próximo e me ensinou a dar valor ao cinema, aos amigos, à música e à vida, tudo isto acima do dinheiro.
Enfim, a morte sempre nos traz incompreensão, às vezes até um estranho fascínio, um medo do silêncio que se abate, uma vontade de estar solidário a quem morre - como ele vai enfrentar sozinho o seu próprio exílio deste mundo?
O poema de Shelley, "ele não morreu, apenas acordou do sonho da vida" sempre me comoveu, quando se fala de morte. E, sim, podemos pensar dessa forma, que isso aqui é um sonho povoado, de boas e más lembranças, podemos até pensar que isso aqui é mesmo um vale de lágrimas.
Mas se choramos pelos mortos, se não entendemos sua partida, se não compreendemos seu destino, pelo menos podemos fazer tudo isso, e, mais que isso, rir pelos vivos, fazer tudo o que for possível por cada um que nós prezamos neste mundo. Assim, driblamos um pouco essa vertigem, e quem sabe encontramos então a verdadeira forma de dizer Adeus ao nunca.
Tudo isso me vem à mente nesta quinta, quando faz uma semana que um grande camarada perdeu alguém próximo, querido, insubstituível (não pude estar presente na hora ruim, mas ficarei devendo essa), de uma maneira incompreensível.
Que todos nós possamos dar toda a força que ele precisar, é a única coisa que posso pensar nesse momento.
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