21 março, 2002

Conto

Passeio de bicicleta
Quando aprendeu a andar de bicicleta, Joana ficou horas dando voltas na rua onde morava. Ela gostou da descoberta de sentir-se capaz de dirigir aquela bicicleta - enorme para sua idade. Mas seu longo passeio deveu-se ao fato de não conseguir resolver o simples problema de parar, pois seus pés não alcançavam o chão e temia machucar-se. Aos seis anos, acho que ninguém quer cair, embora seja muito mais fácil arriscar-se numa queda. Joana não pensava assim. Deixou de almoçar e chegou ao limite do cansaço físico até decidir pular da bicicleta. Jogou-se para um lado e não teve tempo para observar a queda do seu mais novo brinquedo para o outro. Descansou um pouco, rindo de si mesma. Estava sã e salva e havia sido bem mais fácil do que imaginara. Durante todo o tempo em que o lazer e o prazer da descoberta acabaram, Joana esperou que alguém viesse socorrê-la; depois, que viessem a lembrar-se dela. A irmã despreocupou-se, acreditando que ela estava mesmo era se divertindo e que demoraria a desprender-se de uma novidade desse quilate, e a mãe não encontrou razão para amolar-se, ouvindo estas explicações da filha mais velha.
Encontrei Joana por acaso, e foi então que contou-me esta história. “Como vai a vida?”, e outras perguntas comuns nos fizemos. Joana quis me dizer que se imaginava, hoje, montada numa bicicleta, como naquele dia na infância, a dar voltas intermináveis, sem conseguir solucionar nada. Descartou a hipótese de lançar-se ao chão, um para cada lado, como o fez na infância. Diz que o tempo e a experiência fizeram-na mais resistente. Também sabe que, nesse caso, não virá ninguém ajudá-la. “E o que fará, então?”, perguntei. Respondeu-me: desviarei dos buracos, das crianças e do mau tempo, mas só pararei quando minha mente e meu corpo já não mais suportarem e tombarem cansados.