26 março, 2002

Blognovela
Pois é, pessoal. Resolvi aderir à moda lançada pelo André Machado e criar a minha própria novela. Segue aí o primeiro capítulo. A personagem principal é uma mulher de 27 anos, bonita, que se perdeu na vida, ex-policial (expulsa da corporação) e que trabalha como investigadora particular, a serviço até mesmo de alguns policiais que ainda a admiram. Não, não é Kate Mahoney, e sim Marta Morales, a detetive freak. Vejam se aprovam ou não. Mas dêem uns capítulos de tolerância.
AMADA ATÉ OS DENTES
A blog-novela policial do Blogus
Capítulo 1 - Sondagens iniciais
O sol lambe com carinho, aproveitando seus últimos minutos no dia, as ondas cálidas da praia do Arpoador. Nas pedras, casais de banho tomado curtem o entardecer, enquanto crianças saudáveis pululam, vitaminadas e proteinadas. Arpoador? Enquanto isso, Marta Morales, nossa heroína, está em Bangu, dentro de seu Chevette 1978, procurando um endereço obscuro – e mesmo sendo crepúsculo, está um calor filha da puta.
- Porra, mesmo sendo crepúsculo, está um calor filha da puta – diz nossa heroína, Marta Morales.
Ao ver uma casa de quintal ao lado da inscrição-senha “Borraxaria do Nem” (tão perfeita senha que havia até mesmo uma borracharia atrás do pequeno cartaz de papelão), Marta entende que o sinal está dado. Pára o carro, silenciosamente, sai e aguarda, enquanto recapitula tudo o que aconteceu nas últimas horas. Estava em seu apartamentinho na Rua Voluntários da Pátria (em cima da Sonoleve) quando seu fiel amigo e quase-escudeiro o escriturário Sérgio Cabeça-de-Pau-de-Jumento apareceu, sôfrego, dizendo que havia uma pista do traficante gaúcho Paulinho Beira-Rio. Segundo os informantes, Paulinho começava a abrir filiais no Rio de Janeiro, e isso já tinha custado a morte de mais ou menos 25 pessoas – na verdade, Paulinho usava como fachada para a venda de drogas uma rede de pastelarias coreanas, e essas 25 pessoas tinham morrido de intoxicação alimentar.
- Martinha, pega esse papel e vai lá em Bangu, o endereço taí, e tem um sinal. Lá tem uma coroa que está disposta a falar sobre o Beira-Rio – ainda ribombavam na cabeça de Marta Morales as últimas palavras de Sérgio.
A julgar pelo clima que ia ficando cada vez mais estranho, poderiam ser as últimas palavras que iria ouvir de Sérgio em sua vida. Afinal, subitamente todos os fregueses da borracharia desapareceram. Um homem negro, de uns 2,50 de altura, recolheu o cartaz imundo de papelão, não sem antes dar uma olhada para o Chevette de Marta. A reação foi a de sempre, um balançar de negativa com a cabeça e um “tsk, tsk”. Mas ela já estava acostumada. O importante é que, para uma investigadora particular como ela, o importante era ter um carro que não chamasse a atenção.
- O senhor já está fechando? – disse Marta para o crioulo borracheiro.
- Não, é que só vou atender agora ao pessoal que entrar pela chaminé – respondeu.
- Porra, chaminé com um calor desses?
Antes que o negão pudesse concluir sua resposta cretina, dois opalas pretos deram uma volta na praça em frente a toda velocidade, e ambos pararam certinho, um do lado do outro, e ainda cantando pneu – desafiando todas as leis da lógica e da física, afinal, na vida real ninguém teria culhões para ficar tentando estacionar opalas em alta velocidade e ao lado de outro Opala. Um homem de terno preto (vejam bem, em Bangu) e óculos escuros (depois do crepúsculo) saltou de dentro do primeiro Opala, dirigiu-se à Marta (a esta altura, de olhos arregalados e pensando em como teria sido bom comprar a prestação aquele revólver 22 no câmbio negro) e perguntou, com a voz impostada, querendo agradar (nossa heroína é gostosa):
- A senhora...
- Senhorita. (Há, esse diálogo-clichê foi inacreditável)
-...senhorita se chama Marta Morales?
- Sim.
- Então venha conosco. A senhora está presa.
(To be continued)