Do choro, do olhar e suas necessidades
Manhã de domingo, eu deitado, circulando pelos canais. Aparece um dos meus filmes favoritos, "Beleza Americana". E eu fico feliz, pois meu sistema nervoso pede de vez em quando um tipo de desabafo incomum: o choro.
Pode ser no solo de Santana em "Taboo", pode ser ouvindo Joe Cocker cantando "I shall be released", pode ser lendo algo do Pessoa. Mas é sempre certo que no final de "Beleza Americana" eu vou chorar. No momento em que o personagem começa seu discurso intenso sobre a vida que passou, a relembrar os momentos da "stupid little life" (mostrando o quanto a vida pode ser mesmo estúpida, como por exemplo a da personagem vivida por Anette Bening no filme) e diz "um dia vocês saberão", sim, nesse momento eu me preparo.
Porque sei bem que, assim que entrarem os créditos, começa "Because" dos Beatles. Eles não poderiam ter colocado música mais transcendental, mais conveniente para o momento. "Because" nos lembra da morte e da vida - mas da morte em primeiro lugar, pois sua melodia é a de quem já viveu, de quem já viu o universo de perto e voltou para contar como era.
Sim, nesta manhã eu chorei, e isso me fez bem.
Logo depois, "Perfume de Mulher", com Al Pacino. Cena linda, para mim, a mais bonita do filme, não, não é a da dança (com aquela mulher tenebrosamente linda), e sim quando acaba a dança e chega o namorado da garota. Ele fala algumas coisas panacas, cumprimenta Pacino e o rapaz, e depois sai dizendo que eles tinham um encontro com Darryl e Carol.
"Darryl e Carol?", pergunta Pacino. Nesse momento, a cena mais linda. O panaca arrasta a mulher linda, que se vira para olhar os dois. E seu olhar é simplesmente deslumbrante, maravilhoso - algo como a doçura de quem sonha e o amargor de quem acorda.
Claro, para mim os dois filmes têm ligação: tratam da vida ordinária e da extraordinária. Da vida metódica e da vida apaixonada. A vida que a gata que dança tango tem é ao lado de um cara que só está interessado em encontrar Darryl e Carol. A vida que a gata queria ter é uma vida de surpresa, mistério, incerteza e fantasia, a que Pacino oferece (Frank é o nome do personagem, mas prefiro escrever o nome dos atores) naqueles breves momentos.
Como breve é o momento chamado vida - segundo Beleza Americana e toda essa espécie de coisas.
Feliz segunda-feira.
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