31 agosto, 2002

Como garçons
Um de meus filmes preferidos é "Conta Comigo" ("Stand by me", no original), de Rob Reiner. Tá, é um filme bobinho, sobre infância, em torno de quatro garotos que fazem uma pequena excursão mato adentro em busca de....um cadáver. Sim, recém-chegados ao mundo, eles ainda não tinham visto, nenhum deles, como é que se vai embora. E ao saber que um garoto morrera na floresta, partem em busca de contemplar o rosto de um morto.
O filme é baseado em uma novela de Stephen King, e a novela, por sua vez, seria baseada na própria infância do escritor. Dá até para identificar entre os garotos qual que seria King, pois um deles é contador de histórias. A narração em off é do ator Richard Dreyfuss, que só aparece no final do filme, fazendo o papel do garoto contador de histórias, só que com 40 anos a mais.
E quando você já está meio emocionado, vem a idéia de que "nunca se terá amigos como aos 12 anos" - idade dos meninos. É real. Pode-se ter amizades mais sólidas, mais duradouras, mas não como aos 12 anos, quando você está sozinho no mundo de verdade, e aquele moleques da sua idade são seus companheiros de viagem, e todos fingem que não estão com medo da verdade, mas pelo fato de estarem todos juntos o medo diminui. Igualzinho à história de King.
Em outro momento do filme, se fala de amigos em outras idades, que "entram e saem de sua vida como garçons". É verdade. Sim, alguns ficam, eternamente - geralmente, são aqueles que você pode ligar depois de dois anos e dizer, "e aí, ô babaca", sem que ninguém se estranhe.
A amizade é um campo enorme para o surgimento de mágoas. Você some, seu amigo cobra, você fica puto com a cobrança, seu amigo fica puto com o sumiço. Mas é a vida - como em "Sinal Fechado", do Paulinho da Viola, "precisamos nos ver por aí, pra semana, prometo, talvez nos vejamos, quem sabe". E o sinal abre, e todos partem a 300 por hora, porque o sinal está verde e ninguém pode ficar parado.
Mas neste momento em que participo de uma lista com pessoas dos tempos de faculdade, e vejo um monte de gente que eu tinha até esquecido, volto a pensar nessas coisas de amizades que se vão como garçons. E olhando todos, mas todos mesmo, do alto daquela lista de emails, concluí que não deixei nada importante para trás. Os que ficaram, era para ficar mesmo. Os que sumiram, provavelmente não ganharam gorjeta.

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