27 junho, 2002

Luto
Noticiário do site da BBC, urgente:
John Entwistle, bassist for the British rock group The Who, has died in Las Vegas.
Entwistle, aged 57, died on Thursday, a day before the group was scheduled to begin a concert tour in the United States.
The cause of death is still under investigation but is not believed to be suspicious

Deu vontade de pedir a Deus: "Chega, né?"
Depois de nos levar George Harrison no ano passado, eis que John Entwistle, disparadamente o maior baixista que eu já ouvi tocar - quem me conhece de perto sabe que não estou falando isso à toa, só porque ele morreu - ir para o colo da Indesejada.
Dessa vez, a porrada foi grande, e o The Who definitivamente deve entoar seu canto do cisne, pois Entwistle é realmente insubstituível. Claro, muitos argumentarão - com toda razão - que Keith Moon, o baterista, também era. Mas Moon foi substituído por Kenney Jones dando origem a praticamente um novo Who - também muito bom. Com Kenney Jones, gravaram Face Dances e It´s Hard, dois discos que nada têm a ver com aquele Who vigoroso que estávamos acostumados a ver.
Mas Entwistle, no meio da candura que é aquele disco Face Dances, proporciona o momento mais Who, o momento mais hard de todos, que é "The quiet one".
Everybody calls me the/Quiet One/You can see, but you can´t hear me
Por muitos anos isso foi quase a trilha sonora da minha vida. Bastava um atropelo, um senão, uma frustração, e tudo ficava certo naqueles quatro ou cinco acordes de um riff capaz de fazer o Nirvana parecer um canto gregoriano. E Entwislte berrava.
Me lembro das vezes em que, aos 16 anos, subia pelo Morro da Urca para entrar na festa Noites Cariocas, só para ver vídeos no telão. Se hoje já sou baixo, aos 16 era um pirralho, franzino, que só queria a música redentora: o rock and roll. E vinha Entwistle tocando com seus milhares de dedos um baixo gigantesco, enquanto soprava com uma voz gutural: "Boooorris the spider!".
Era a realização. Ainda tinha "Dangerous", do It´s Hard, composição dele, Can you see me/Watching you in the darkness/Touching you like a sickness/Fear is take control, canções que eu e meus amigos de então berrávamos junto enquanto Pete Townshend, narigudo, gênio e complexado praticamente se fundia com uma guitarra.
John Entwistle realmente fez parte da minha vida até agora. Continuará, com certeza. Mas é impossível não ficar uma grande tristeza ao saber que um gênio da música se foi, que sua produção parou. Me soa como uma Injustiça Divina - nós que ouvimos falar tanto em Justiça Divina, deveríamos reclamar, pedir a Deus que desse imortalidade aos músicos, e Ele responderia, "mas Entwistle já não a tem?", e eu sorriria em lágrimas.
The Quiet One se calou de vez.