18 junho, 2002

Lies
Acho a mentira um tema fascinante. Não a mentira deliberada, simplesmente para se livrar de um perigo qualquer. Mas a mentira como em um conto de Júlio Cortázar, do livro "Todos os fogos o fogo".
O cara vai para uma guerra e morre. A matriarca da família, que recebia cartas do filho toda semana, pode morrer se souber que o cara morreu. A família decide então que o herói de guerra não tem corpo, será enterrado lá mesmo, mas pode continuar escrevendo. E forjam, toda semana, uma carta para a senhora idosa. Todas as semanas prometendo que vai voltar.
A matriarca morre, sem saber que o filho já tinha morrido antes. O filho nunca voltaria.
No momento em que a matriarca morre, a família se flagra, cada um deles, se flagra pensando em como iria fazer para dar ao filho que tinha ido para a guerra a notícia de que sua mãe tinha morrido.
Enfim, um conto de mestre - e que me faz pensar sobre as várias mentiras que a gente vai alimentando. Uma delas, para mim, por exemplo, era a de ser disc-jockey de rock and roll. Depois de uns probleminhas de relacionamento, notei que não iria mais ser chamado, e aí decidi eu mesmo acabar com a mentira: não sou DJ de porra nenhuma. Mas eles também que não me encham o saco. E pronto - morreu uma mentira, e eu me senti melhor com isso.
Meu sentimento foi tão positivo que tive vontade de propor a todos meus amigos um Primeiro de Abril às avessas: o Dia de Acabar com as Mentiras. Principalmente aquelas entre homens e mulheres, que são as piores.
O pior: estou mentindo. As mentiras entre homens e mulheres podem ser lindas sim - a elas damos o nome de sedução. Que pode ser uma mentira em forma de perfume, de Plax anti-hálito, de lentes azuis ou mesmo de uma música do Sinatra tocada muito baixinho perto dos ouvidos de dois que se amam.
In the wee small hour of the morning.