14 dezembro, 2001

Garoto das flores

O pátio do colégio era grande demais pra mim, então eu ficava sentada na sala de aula, lendo qualquer coisa ou olhando pelas janelas altas, tentando descobrir se o meu pensamento quereria mesmo estar lá embaixo junto às outras crianças brincando, ou não. Das esquisitices que eu fazia, a minha preferida era sentar, na hora do recreio, nos degraus que levavam à sala e esperar que o garoto aparecesse. Ele sempre vinha, dez minutos antes do sinal tocar e sentava-se ao meu lado, alegre e suado, as bochechas um pouco arredondadas apesar do corpo magro. Impossível lembrar-me sobre o que conversávamos. Ele respeitava o meu isolamento.
Um dia ele me confessou que estava apaixonadinho por uma colega da turma, a Carolina. Que era “coisa de criança”, descobri depois; pois naquele momento era muito sério. Eu acertei um encontro dos dois, secretamente, no final do pátio, ao lado da mangueira centenária. Não disse para ela que era ele quem a esperava, embora ela já soubesse. Eu queria ver meu amigo feliz.
Para demonstrar sua amizade e gratidão ele me deu uma flor amarela e eu não esqueci da cor, entretanto, qual era a flor? Pela primeira vez o meu sorriso escapulia para alguém fora do meu habitual.
Passei a acreditar que todos os outros amigos que viesse a ter iriam me dar flores também. Sem querer, o garoto das flores potencializou nossas decepções: tornamo-nos ingênuos. Mas valeu a pena, só porque o tempo passou, foi o que concluímos, outro dia, num almoço.