14 outubro, 2002

Aquele abraço
Domingão alto astral, quer dizer, mais o final dele, porque até 18h eu permaneci prostrado em minha clínica particular de recuperação para ressacados: meu quarto com TV, ar condicionado, gelo e coca-cola, além das revistas da semana e do jornal. Depois de plenamente - ou quase, vamos dizer, 70% recuperado, fui ao show do Gilberto Gil na praia de Copacabana, em frente ao Copa, perto da casa de Marcele, onde passei antes.
Gil atravessa um momento da carreira que não se afina muito com meu gosto: está tocando a obra de Bob Marley, que tem músicas bonitas como "Is this love" e "No woman no cry". Mas no geral, não curto reggae, essa música de dois acordes e milhões de tranças. Sou mais "sofisticado": gosto mais de um gênero aí que tem três acordes.
Mesmo assim, Gilberto Gil tem aquele problema: o cara é excelente, os shows dele são SEMPRE bons, não tem jeito. Pode ser um mala, cabo eleitoral de ACM, enfim, podem acusar ele de tudo - menos de ser ruim. Cantando absurdamente bem, tocando idem, comandando a platéia, com repertório que não deixa ninguém ficar parado. E muito bonito ver ele e Rita Lee cantando, mais de 30 anos depois da gravação original com os Mutantes, o clássico 'Domingo no parque'.
Claro que a idade avançada e a ressaca me fizeram sair antes do show terminar, além, é claro, do ambiente de apreensão. Este é outro tema chato: em virtude de haver, há mais de dez anos, um "loteamento" informal da Praia de Copacabana, qualquer show da praia é cheio de "gangs" dos morros que têm no Leme e no final da Santa Clara, naturalmente. Sem contar o Cabritos. São garotos que não fazem exatamente parte do tráfico, mas seguem sua ideologia e se apóiam moralmente nos traficantes. Costumam brigar entre si na Praia de Copacabana - como já aconteceu diversas vezes nos domingos de sol (até já fui cobrir um pós-tumulto ali perto, em 1995, por A Notícia).
Essas gangs, além de brigarem entre si, ainda escolhem suas vítimas para roubo usando o critério distração + solidão. Se o cara estiver sozinho ou com a namorada (o meu caso), e entretido com o show, se torna um alvo mais fácil, vitimado pelo elemento surpresa e obviamente pelo fato de serem 15 contra um.
Bom, isso tudo é para dizer que assisti ao sempre bom show do Gil sentindo muito mais paranóia do que o artista sentia, na época em que o SNI mandava e o DOI CODI fazia acontecer. Hoje, o buraco é mais em cima.
De qualquer maneira, o show do Gil foi bem em frente à Rua Fernando Mendes, onde fica um dos locais mais espetaculares do Rio: a Tratoria. Pãezinhos de alho, um cálice de Chianti, um spaghetti ao molho matricciana, uma pizza margarita com folhas de manjericão e o encerramento com chave de ouro, a torta alemã gelada da tratoria, bom, tudo isso fez eu e Marcele renovarmos o fôlego. E em seguida, a reunião de sempre na casa do Maloca, que desautorizou o uso da foto dele na campanha "Sid Vicious é o caralho, punk é o Maloca".
Mas no final das contas, valeu o domingo.