Comemorando a recente parceria assinada em contrato com a jornalista e cronista Alessandra Archer, o Blogus inaugura a série "Meninas que achamos legais". A primeira a preencher bem o espaço é Crib Tanaka, do Cena Urbana, outro site bacana de literatura alternativa.
Divirtam-se.
FRIO
por Crib Tanaka
Ele veio andando em sua direção, olhando-a fundo nos olhos e postou-se
diante dela. Ela, sem saber o que passava, estendeu-lhe a mão. Sentaram-se
no banco que havia um pouco mais adiante.
As mãos dele eram fortes, grandes, engoliam seus pequenos dedos. Ele estava
de preto. E mesmo apesar da fina blusa, o frio não havia tirado o calor de
seu corpo.
Suas mãos foram abraçadas pelas dele, como nunca havia acontecido. Ele,
então, fechou os olhos e começou a respirar fundo. Ela o olhava, sem
conseguir falar nada. Abria a boca e pensava em expressar-se com palavras,
mas não conseguia. Iria interrompê-lo. Podia ver, pelas pálpebras trêmulas
dele, que visões conturbadas passavam por sua cabeça. Volta e meia, ele
desviava com a cabeça de pessoas que via ou sorria com o canto dos lábios,
ao ver-se em lindos lugares.
Ela sentia o dia passando. E sentia frio agora. O vento a chateava por
levantar um pedaço da saia, mas gostava de sentir os cabelos batendo no
rosto, mesmo que machucasse um pouco. Pensou em puxar a mão. Ele parecia em
transe. Tinha medo de que ele dormisse. Não poderia ir para casa andando
sozinha, tarde da noite.
Por um momento, cedeu e fechou os olhos. Logo sentiu os pés saírem do chão.
Viu coisas, pessoas, lugares, caminhos, homens, crianças, mulheres dançando,
flores, livros – tudo muito rápido e sem nexo algum, sem aparente ligação.
Assustada com a rapidez das imagens que via, jogou o corpo para trás e puxou
as mãos para si. Abriu os olhos e viu que ainda era dia.
Era final de tarde de verão. A chuva começava a cair. Fina. Gelada. Ele a
olhou e não disse nada. A encontraria no futuro. E aí, sim, falariam sobre
esse dia.
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