31 outubro, 2001

SEPARAÇÃO
Enquanto ela chora no seu pequeno quarto azul, ele embarca num avião.
Aperta-se o nó na garganta dela, falta-lhe ar: medo de não mais amar.
Aperta-se o cinto de segurança no abdômen dele. Medo de voar.
A lágrima escorre rasgando-lhe o rosto e borrando-lhe a maquiagem. Ela sente-se fraca e impotente.
O avião decola, o estômago parece encolher-se, como se houvesse levado um soco. Sente-se possuído por uma sensação de fragilidade.
Ela examina-se no espelho de molduras douradas acima da cômoda.
Ele ora como criança em meio à turbulência enfrentada logo após a decolagem.
Desfez-se a maquiagem. Os olhos inchados. Borrões negros no rosto ocasionados por uma triste água salgada.
O terno está descomposto, a face ilustra pavor e desespero, responsabilidade única de uma tempestade respingando incessante no vidro do avião.
Ela respira fundo. Limpa com papel higiênico o borrão no rosto.
Ele bebe uma dose de uísque, relaxa.
Sentada ao computador, ela tenta escrever uma poesia. Seus olhos embaçam novamente, não consegue expelir uma frase.
Recomposto, sentado à poltrona azul do boeing, ele agora tenta concentrar-se na leitura do jornal. Não consegue fixar uma linha.
Ela despe-se e vai dormir; pretende pensar nele no dia seguinte.
Ele dorme embriagado, covarde e sem pensamentos. Não possui sobriedade para prever o amanhã. Mas pensará nela e no relacionamento findo após quinze anos e dois filhos.

1 Comments:

At abril 26, 2009 10:54 AM, Anonymous André Aires said...

Nossa, te encontrei no google e pretendo voltar por aqui...

Só quem já passou por isso tem idéia de como é...

 

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