20 maio, 2002

Na Lapa

Se bem me lembro, na última vez em que estivera na Lapa tomei um chope no Nova Capela. Faz um tempinho. Porém, especificamente, na Rua Joaquim Silva, não sei quando estive pela última vez. Minto: sei sim. Foi neste fim de semana. E quando escrevi “a última vez” é porque é a última vez mesmo.
Não adianta fazer referência ao passado boêmio e tradicional do lugar e, nostálgica, usar o blábláblá para dizer o que todo mundo sabe. Eu também não era assim há três anos.
A Lapa está muito viva. Está lá a diversidade de que tanto falam devidamente demonstrada nas músicas, bares e no público. Turistas passam apalermados, filmando tudo. A multidão lota a Rua Joaquim Silva, andando devagar. Eu não tinha noção que estava assim. Bem, eu li uma matéria, se não em engano no Jornal do Brasil, comentando sobre a efervescência do lugar, mas não imaginei esta situação, tanto que me assustei. Resultado: lá estava eu, em meio à multidão, com três amigos. A primeira impressão foi a de estar numa festa junina, com a rua toda enfeitada para a Copa, milhares de barraquinhas por todos os lados, o que já não era muito agradável. Parece que até o ânimo para esta Copa do Mundo está forçado. Alguns homens circulavam com uma bandeja na mão vendendo doses de uísque no meio do povo. Melzinho pra lá, batidas pra cá. Alegando velhice e cansaço, conformada por já estar lá, sugeri que entrássemos no bar da esquina. Ainda bem, porque dez minutos depois, um tiroteio transformou a rua num cenário de guerra. Um morto na escadaria que leva ao Convento de Santa Teresa, aquela mesma que a partir de 1990 vem sendo azulejada pelo pintor chileno Selarón, morador da subida, e autor da idéia de pôr azulejos colados nos degraus usando somente as cores da bandeira do Brasil. Pouco tempo depois, mais tiroteio, dessa vez muito perto de onde eu estava. O dono do boteco e seu ajudante cerraram as portas e ficamos trancados dentro do bar. Eu atrás dos engradados de cerveja. Meu amigo colado feito lagartixa na parede. Pessoas deitadas no chão. Alguém derrubou um copo de vinho vagabundo na minha blusa branca. O bar reabriu, saímos para procurar o caminho de casa e estava lá o corpo estendido no chão. O que aconteceu? Nada. Todos continuaram bebendo, cantando, dançando, fumando, felizes, alheios, entorpecidos, como se não tivesse acontecido nada fora do normal. Mas precisava acontecer tanta normalidade a minha volta, caramba?